Salvador abre guerra contra o barulho

Equipado com alto-falantes potentes, carros como este animam festa de jovens. A cada 15 minutos, uma pessoa reclama do som alto na capital baiana
Com seus infatigáveis blocos de Carnaval, trios elétricos e grupos de axé despejando os sucessos do verão (que podem se estender por todas as estações do ano), Salvador sempre se orgulhou de reunir o povo mais festeiro do Brasil. Tanta empolgação acaba de render à capital baiana um título inédito – o de cidade mais barulhenta do Brasil, segundo a Organização Mundial da Saúde – e está incomodando os próprios soteropolitanos. O barulho não se deve apenas aos muitos eventos do calendário oficial da alta estação.
De acordo com a Superintendência de Controle do Uso e Ordenamento do Solo do Município (Sucom), órgão com a atribuição de fiscalizar os excessos sonoros na cidade, cerca de 30% dos abusos são cometidos por donos de carros particulares. É possível contar um, dois, três e até mais veículos em frente a cada bar, boteco, barraca de bairro, loja de conveniência e posto de combustível da cidade. Todos com o som no máximo.
Em 2008, a Sucom recebeu 35.074 queixas – quase cem por dia, ou uma a cada 15 minutos. O coordenador do órgão, Cláudio Silva, afirma que seus 36 fiscais têm dificuldade para fazer frente à turba, mas nem por isso ficam parados. No ano passado, foram feitas 1.159 notificações e aplicadas 551 multas, a maior delas no valor de R$ 30 mil. Os fiscais apreenderam 89 equipamentos de som. Além da Prefeitura e do Ministério Público, a guerra dos que querem silêncio contra a turma do barulho tem o apoio do Sindicato dos Donos de Postos de Combustíveis. No ano passado, o órgão promoveu uma campanha educativa para tentar reduzir a incidência das reclamações nos postos. Cartazes com mensagens provocativas foram fixados. Uma delas dizia “Potência se mostra na cama, não aqui”.

A Lei no 5.354, de 1998, que determina os índices de utilização sonora na capital baiana, limita em 70 decibéis o nível de ruído entre 7 e 22 horas. Das 22 às 7 horas, o volume deve ficar abaixo dos 60 decibéis. Quando o índice não é respeitado, a lei prevê multas de R$ 480 a R$ 91 mil, além da apreensão do equipamento sonoro.

Do outro lado do front, a Associação dos Produtores Culturais de Salvador quer mais barulho – isso mesmo. Pede que a lei mude para garantir não menos, mas mais decibéis. O argumento é que a cidade atrai turistas justamente por suas festas populares. Curiosamente, é durante o Carnaval, quando os batuques tomam conta de Salvador, que as queixas diminuem. Isso porque a festa ocorre em locais e horários preestabelecidos, respeitando quem quer sossego.

Fora dos quatro dias oficiais da folia, porém, a situação complica. “Já não se encontra paz em Salvador, nem em cidades próximas”, diz a escritora Mabel Veloso, irmã de Caetano e Maria Bethânia. “Santo Amaro, por exemplo, há até pouco tempo era uma cidade pacata. Agora, a casa de minha mãe, que está com 101 anos, chega a pulsar com o som dos carros que passam por sua porta”, diz Mabel. (Época)

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