Imagem de 'playboy' de Kim Dotcom, do Megaupload, ocultava mente aguçada

A vida dele era dominada por carros velozes, férias em superiates de US$ 10 milhões e uma obsessão por videogames de combate. Mas amigos de Kim Dotcom, o antigo hacker procurado pelo FBI como criador de sites de pirataria que supostamente custaram até US$ 500 milhões em receita perdida aos detentores de direitos autorais, disseram que sua imagem caricatural havia sido desenvolvida cuidadosamente com o objetivo de ajudá-lo a ganhar uma fortuna. A realidade, afirmam, é que ela obscurece uma inteligência empresarial aguçada e um imenso poder de decisão. 

Dotcom, 38, nasceu na Alemanha e era conhecido como Kim Schmitz. O fascínio público com o caso Megaupload foi alimentado pela divulgação de detalhes sobre seu estilo de vida extravagante, conduzido sob ampla variedade de pseudônimos, entre os quais Kimble, King Kimble e Kim Tim Jim Vestor. 

Em 2001, por exemplo, ele realizou uma luxuosa viagem a Mônaco envolvendo uma frota de automóveis de luxo, um imenso iate e helicópteros. Dotcom também encomendou um documentário para a ocasião, apresentado pelo descabelado comediante de TV alemão Frank Lämmermann. O propósito verdadeiro, diz um antigo colega de Dotcom que ajudou na organização da viagem, era criar uma sensação de que a riqueza dele era na realidade maior do que parecia, como parte dos esforços do empresário para levantar capital para novos negócios.

"As festas eram em parte operações de publicidade e relações públicas", diz a fonte, que pediu que seu nome não fosse mencionado. "Ele desejava demonstrar que era o maior e o melhor e que tinha muito dinheiro. Em 2000, ele não tinha tanto dinheiro quanto demonstrava ao mundo ter."

O filme "Kimble Does Monaco" mostra seus convidados a bordo do iate Golden Odyssey com mulheres de biquíni, entre as quais Gitta Saxx, modelo da revista "Playboy". Em uma das cenas, um grupo de mulheres seminuas leva um banho de champanhe na piscina do iate, observadas pelo "capitão Kim", de terno preto e suéter de gola polo e calçando sapatos bicolores. Outra cena mostra seus amigos cantando para ele em torno de um piano de cauda, antes da saída do grupo para assistir ao grande prêmio de Mônaco em um camarote posicionado logo acima do grid de largada.

A extravagância e o culto à personalidade de Dotcom mascaravam não apenas sua inteligência mas seus antecedentes e verdadeira personalidade, disse a fonte.

"Nós éramos bem próximos, mas eu nunca sabia o que ele realmente estava pensando. Em alguns momentos, ele era uma ótima pessoa. Em outros, era horrível. Mas sempre foi bom em reunir pessoas em torno de si e convencê-las a fazer o seu melhor por ele. Conseguia argumentar com elas e motivá-las a fazer o que ele desejasse."

"Ele nunca falava sobre sua infância, mas creio que não tivesse contato com o pai. Era um pouco como o menino gorducho e sem amigos que tinha apenas seu computador", acrescentou a fonte.

Enquanto o FBI estava concluindo sua lista de acusações contra Dotcom, no final do ano, acusando-o de conluio e lavagem de dinheiro em um dos maiores casos criminais relacionados a direitos autorais já iniciados nos Estados Unidos, Dotcom postou um vídeo que o mostrava se tornando o maior jogador mundial de "Call of Duty: Modern Warfare 3", videogame ao qual dedicava dezenas de horas. Os colegas celebraram a obtenção do melhor "kill to death ratio" (índice entre mortes causadas e sofridas) com gritos e confetes e um bolo comemorativo na forma do número um.

Outro antigo colega de negócios, em anonimato, disse que "Dotcom era um homem muito inteligente, muito esperto, muito rápido no raciocínio, muito determinado e muito pedante". Embora fosse uma pessoa confiável --"dentro de limites"--, ocasionalmente demonstrava sinais de "problemas de ira" e muitas vezes "acreditava que o dinheiro pudesse resolver qualquer coisa", disse a fonte. "Ele gosta de sentir que é Deus".

Dotcom cresceu em Kiel, perto de Hamburgo. Depois de começar como hacker, passou a assessorar companhias com segurança de computadores. Em 2000, criou a Kimvestor, uma companhia de capital para empreendimentos, começou a fazer fortuna e tornou-se figura permanente na cena noturna de Munique. Quando a bolha pontocom estourou, no começo de 2001, ele adquiriu ações de um site em crise e prometeu investir mais, mas vendeu suas ações assim que a cotação delas subiu. E então as coisas se complicaram. Em janeiro de 2002, foi preso na Tailândia e passou cinco meses detido antes de ser condenado, em Munique, pelo uso de informações privilegiadas para ganho indevido. A sentença foi de 20 meses de liberdade condicional, acompanhada por multa de € 100 mil.

Dotcom recentemente afirmou que lamenta ter alardeado demais a sua riqueza e defendeu sua conduta no período da bolha pontocom. "Meu erro foi abraçar a mídia e lhe dar as histórias que ela queria", escreveu ele no site Torrent Freak, em dezembro. "Vamos simplesmente colocar isso na categoria 'jovem e burro'. Eu oferecia a eles [veículos da mídia] um vislumbre do meu estilo de vida exclusivo. Por essa sinceridade, fizeram de mim o bode expiatório quando a bolha da nova economia alemã estourou, em 2000."

"Fui condenado por negociar ações usando informações privilegiadas (quando na verdade salvei uma empresa e mais de 120 empregos) e recebi uma sentença de liberdade condicional porque o juiz e o promotor ofereceram um acordo aos meus advogados. Meu registro criminal foi expurgado, nos termos da lei página em branco da Alemanha. Posso alegar oficialmente que jamais fui condenado. Cometi erros quando era jovem e paguei o preço. Agora tenho 37 anos, sou casado, tenho três filhos adoráveis, com mais dois a caminho (meninas gêmeas --yeah!) e sei que não sou uma pessoa má. Cresci e aprendi."

Vizinhos do imóvel de 12 hectares ocupado por Dotcom perto de Auckland confirmam que ele vivia com relativa discrição antes da prisão. "Nós o víamos de carro pela região, mas era muito discreto, e somos vizinhos muito próximos", disse Libbi Darroch, enquanto cuidava de seu cavalo de equitação Muffy no clube equestre Coatesville. "Eu o via dirigindo seu carro com a placa de licença 'GUILTY' [culpado]".

Mas, apesar dessa relativa discrição, o indiciamento do FBI contra Dotcom e quatro outros acusados apela pelo confisco de £ 175 milhões em dinheiro e registra 57 contas bancárias na Alemanha, na Austrália, na China, em Cingapura, na Eslováquia, nas Filipinas, na Holanda e na Nova Zelândia. A lista de ativos inclui 15 carros Mercedes com placas especiais como "STONED" ("chapado"), "MAFIA" e "POLICE" e veículos como um Maserati, um Rolls-Royce Phantom com a placa "GOD" (deus) e um Lamborghini, além de 60 servidores de computador e diversas esculturas e obras de arte.

O indiciamento também aponta que, entre abril e junho do ano passado, as empresas de Dotcom gastaram cerca de US$ 8 milhões na locação de iates no Mediterrâneo. fonte: GUARDIAN
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