Cinco meses após a entrada em vigor da nova Lei do Inquilinato, proprietários de imóveis ainda sofrem com os maus pagadores. A medida, que prometia acelerar o despejo dos locatários inadimplentes, ainda não corresponde a todas as expectativas do setor, segundo especialistas ouvidos pelo site G1.
Uma das mudanças mais esperadas, a que determina que os locatários inadimplentes deixem os imóveis em menos tempo - cerca de 15 dias - , por exemplo, não pode ser aplicada em todas as situações. Para que isso seja possível, o locador deve entrar na Justiça com um pedido de liminar (decisão provisória). E é nessa hora que a frustração pode chegar.
Isso porque não são todas as situações que dão esse direito ao locador. A lei prevê que a liminar seja solicitada apenas no caso de o locador não ter pedido qualquer garantia ao seu inquilino antes de alugar o imóvel.
A aposentada Ilza Bereli, 65 anos, aluga um imóvel há dez anos e acumula problemas com inquilinos desde então. A solução foi recorrer à Justiça para solucionar alguns deles. Depois de ficar oito meses com o imóvel fechado - "para evitar dor de cabeça por um tempo" - , Ilza resolveu tentar mais uma vez e alugou seu imóvel há pouco mais de dois meses.
"Enquanto eu não achei um inquilino que me desse todas as garantias de que pagaria o aluguel, não aluguei. O que adianta essa lei? Para ter o direito de despejar o meu inquilino com mais rapidez, vou correr o risco de alugar sem garantia? Não faz o menor sentido", disse.
"A gente sabe que isso [alugar sem garantia] não acontece na prática. Ninguém aluga um imóvel sem pedir um fiador, por exemplo", disse a diretora comercial da Lello, administradora de condomínios, compra, venda e locação de imóveis, Roseli Hernandes.
Os advogados que trabalham com direito imobiliário têm dado a mesma orientação a seus clientes. "A maior crítica que faço não é pela lei em si, mas pela esperança que ela criou nas pessoas, fazendo crer que o processo de locação sofreria uma rapidez descomunal. Sempre que somos consultados, aconselhamos que o locador não acredite na rapidez da nova lei e exija as garantias", disse o advogado Alexandre Berthe, do escritório Berthe e Montemurro Advogados Associados. Hoje, os três tipos de garantia mais utilizados são fiador, seguro-fiança e caução, que corresponde a três vezes o valor do aluguel.
A ideia do despejo mais rápido também pode, de certa forma, servir em outras situações. No entanto, ainda não é uma garantia, na avaliação de especialistas e do próprio Judiciário. De acordo com a nova lei, o devedor que está sendo processado (não por meio de liminar) terá apenas 15 dias para pagar a dívida depois de ser notificado pela Justiça. Antes, ele era citado mais vezes e não tinha prazo para acertar as contas.
"Varia de ação para ação, de situação para situação. Não é possível afirmar que, em todos os casos, o entendimento será o mesmo. Não é uma regra. Na minha opinião, a lei foi vendida como a solução para todos os problemas. Mas não sei se isso vai mesmo acontecer", disse o juiz-assessor da Corregedoria Geral da Justiça do Tribunal de Justiça de São Paulo, Hamid Charaf Bdine Júnior.
Normalmente, uma ação de despejo por falta de pagamento leva de seis a 12 meses para sair, segundo especialistas. Hoje, esse período ainda não foi reduzido por conta da nova lei. "Não influenciou nada. Porque, em alguns casos, mesmo que o inquilino seja citado apenas uma vez, demora. A lei até tenta simplificar, mas não muda muito", disse a diretora da Lello.
Mudança na prática - Para o diretor de locação da Associação Brasileira das Administradoras de Imóveis (Abadi), Carlos Samuel de Oliveira Freitas, por enquanto, os fiadores têm sido os mais beneficiados pela nova Lei do Inquilinato, já que agora é permitido desistir do compromisso antes de o locatário entregar as chaves ao proprietário.
"Nós já vemos que os fiadores estão se movimentando, se exonerando de suas responsabilidades. De resto, ainda está um pouco cedo para saber, já que tudo depende do Judiciário, e sabemos que toda lei tem um período de maturação", afirmou.
No Rio de Janeiro, de acordo com o advogado Eduardo Rodrigues Jr., da Martinelli Advocacia Empresarial, a Justiça do Estado já tem dado decisões favoráveis aos locadores, com base no que prevê a nova lei.
Aprovada - De acordo com levantamento do diretor de legislação do inquilinato do Sindicato da Habitação de São Paulo (Secovi-SP), Jaques Bushtsky, o número de ações locatícias distribuídas nos fóruns da capital tem registrado queda acentuada nos últimos meses.
Em março de 2009, por exemplo, havia 2.124 ações de despejo por falta de pagamento. No mesmo mês deste ano, dois meses depois de a lei ter entrado em vigor, esse número caiu para 1.699.
"As pessoas estão tentando acordos antes de tudo, já que a chance de ser despejada com mais rapidez agora é maior", disse o diretor. G1