A Câmara dos Deputados aprovou, no início do mês, a realização de plebiscitos no Pará para consultar a população sobre as propostas de desmembrar o território para criar dois novos Estados: Carajás e Tapajós. Entretanto, ainda não se sabe se todos os paraenses poderão votar, já que não há consenso nem mesmo entre os autores dos projetos sobre quem deve participar do referendo.
Isso porque, para defender a realização de plebiscito, os dois projetos citam o mesmo trecho da Constituição Federal (o terceiro parágrafo do artigo 18), o qual diz que deve ser consultada sobre a mudança “a população diretamente interessada”. Assim, fica no ar a dúvida: afinal, quem pode ser afetado pela alteração? Todo o Estado, apenas os municípios que serão desmembrados, ou todo o Brasil?
Para o senador Mozarildo Cavalcanti (PTB-RR) e o deputado federal Wandenkolk Gonçalvez (PSDB-PA), respectivamente autor e relator do projeto que cria Tapajós, o tema interessa a todos os municípios do Pará e, portanto, toda a população do Estado deve ser consultada. Já para o deputado federal Giovanni Queiroz (PDT-PA), autor da primeira proposta de criar o Estado de Carajás, a decisão cabe apenas aos moradores das cidades que serão desmembradas do Pará.
O tema é polêmico e, de acordo com o especialista Carlos Ari Sundfeld, professor da escola de Direito da FGV (Fundação Getulio Vargas), provavelmente, a responsabilidade de pôr fim à dúvida ficará para o TSE (Tribunal Superior Eleitoral).
- É polêmico. Eu acredito que a Justiça deverá entender como ‘parte interessada’ o Estado inteiro, devido aos impactos que essa mudança acarretará para os demais municípios.
Para Sundfeld, a Justiça deverá seguir o que diz a lei 9.709 (de 1998), que trata justamente da realização de plebiscitos deste tipo, que entende como população diretamente interessada “tanto a do território que se pretende desmembrar, quanto a do que sofrerá desmembramento”.
Ciente da controvérsia, o deputado Wandenkolk disse ao R7 que já consultou o TSE sobre quem deve participar do plebiscito, e aguarda uma resposta para os próximos dias. Porém, a assessoria da Corte informou que caberá ao TRE-PA (Tribunal Regional Eleitoral do Pará) deixar claro quem poderá opinar sobre as propostas, e acrescentou que só irá se pronunciar se o tribunal regional o consultar – o que ainda não ocorreu.
Já o deputado Giovanni Queiroz afirmou, por meio de sua assessoria, que se o TSE interpretar que todo o Estado deve participar do plebiscito, ele irá recorrer ao STF (Supremo Tribunal Federal), pois considera a medida “inconstitucional”.
E o Brasil? - Enquanto a bancada paraense discute quem deve opinar dentro do Estado, há quem interprete como “parte interessada” todo o Brasil, devido aos impactos que a criação de dois novos Estados sobre os cofres da União.
É o diz o pesquisador Rogério Boueri, do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), que calcula que Carajás e Tapajós causarão um saldo negativo anual de cerca de R$ 2 bilhões ao governo federal – sem contar os custos para a instalação dos novos poderes.
As chances de toda a população brasileira ser consultada, como ocorreu em 2005 durante a discussão sobre desarmamento, são quase nulas. Mas nem por isso os demais Estados deixarão de ser questionados sobre o tema, como explica Sundfeld.
- A oitiva do Brasil é feita através dos representantes no Congresso Federal, porque não basta a realização de um plebiscito, é preciso que o Congresso aprove essa lei complementar. [...] E, certamente, não será uma discussão fácil, pois não têm apenas efeitos financeiros, mas impactos na representação política do país, o que é mais grave ainda.
Além de Tapajós e Carajás, tramitam no Congresso outras propostas para criar mais sete Estados e quatro territórios, fazendo com que o mapa do Brasil passe a ser dividido em 33 Estados e quatro territórios, além do Distrito Federal. O plebiscito a respeito da criação do Estado de Carajás deve ocorrer até novembro. FONTE:R7