A Funai impediu o afastamento de uma socióloga indígena que iria a um encontro da ONU (Organização das Nações Unidas), no qual criticaria a usina hidrelétrica de Belo Monte, a ser construída no rio Xingu (PA).
Azelene Kaingáng, filha de indígenas e funcionária da Funai em Chapecó (PR), falaria, nos dias 17 e 19 deste mês, no 10 Fórum Permanente da ONU sobre Questões Indígenas, em Nova York (EUA). Anual, esse é o principal evento da entidade em relação ao assunto.
Azelene foi a todas as edições, com as despesas pagas por organizações não governamentais internacionais. O mesmo aconteceria agora.
Apesar de funcionária do órgão federal, no qual atua como auxiliar administrativa, ela nunca representou o governo, mas sim os povos indígenas brasileiros.
Em todas as outras vezes, a Funai permitiu seu afastamento da função para a viagem. Dessa vez, não. Se viajasse sem a permissão, ela poderia sofrer um processo administrativo e acabar demitida.
Em memorando, o órgão se justificou afirmando que mandará outros dois funcionários ao fórum, e que não é do "interesse da administração pública a participação de outros servidores". Os enviados do governo terão as viagens e diárias pagas com verba pública.
Os dois não falarão no lugar de Azelene. Se fosse, ela teria ao menos três espaços para expor sua opinião sobre a mega-usina.
No dia 17, falaria na plenária do encontro. Dois dias depois, participaria de dois eventos paralelos.
Segundo ela, sua ideia era explicar aos participantes "como o Estado conduziu as consultas públicas feitas ao índios no processo de licenciamento de Belo Monte".
Ações judiciais de ONGs e do Ministério Público Federal apontam essa como uma das principais falhas no rito da licença prévia à obra --cujo próximo passo é conseguir a chamada licença de instalação, que permite o início de sua construção.
Ela também falaria sobre a recomendação da Comissão Interamericana de Direitos Humanos da OEA (Organização dos Estados Americanos) do mês passado para que o Brasil suspenda o licenciamento da usina.
"Eu ia dizer que a medida da OEA não pode ser encarada como uma afronta ao Estado brasileiro", disse.
Conforme a Folha revelou, a decisão da comissão irritou a presidente Dilma Rousseff, que ordenou suspender o repasse de verba à entidade previsto para este ano, de US$ 800 mil (equivalente a R$ 1,3 milhão).
Para Azelene, sua não liberação é "um absurdo".
OUTRO LADO - Procurada, a Funai reafirmou os argumentos usados no memorando mandado para Azelene.
De acordo com a assessoria do órgão, "os servidores da Funai que irão participar do encontro falarão sobre questões indígenas e também sobre Belo Monte". FONTE: FOLHA.COM