Forçada a casar e torturada aos 13 anos, afegã é exemplo raro de justiça

 
Segundo autoridades, quando ela se recusou a se prostituir ou a fazer sexo com o homem com quem foi obrigada a se casar aos 13 anos, a família do noivo de Sahar Gul a torturou e a atirou num porão imundo e sem janelas por meses, até que a polícia a encontrou deitada sobre palha e fezes de animais.

Em julho, um tribunal de segunda instância manteve as sentenças de dez anos a cada um de seus três parentes por afinidade, decisão anunciada como um triunfo jurídico, ressaltando os progressos dos direitos femininos na última década. Ela está se recuperando das feridas, físicas e emocionais, num abrigo feminino em Cabul.

Porém, para muitos defensores dos direitos femininos, o caso dela, que atraiu a atenção do presidente afegão, Hamid Karzai, e da imprensa internacional, é a exceção que comprova a regra: uma pequena vitória em meio a inúmeros casos de violência contra a mulher que nunca são revelados.

Além disso, os grupos de defesa temem que o progresso hesitante conquistado na proteção de algumas mulheres se perca caso o foco do Ocidente no Afeganistão comece a mudar enquanto as tropas da Otan se retiram e ocorre uma redução do dinheiro internacional enviado para a economia.

De acordo com os promotores e autoridades do governo, Ghulam Sakhi pagou pelo menos US$ 5 mil por ela, um negócio ilegal. Ele foi embora com Sahar Gul para a casa de seus pais, em Baghlan, outra província no norte do Afeganistão, a centenas de quilômetros dali.

A primeira esposa de Ghulam Sakhi fugiu depois de ser espancada pelo marido e pela sogra por não engravidar, segundo declarações de Rahima Zarifi, presidente do departamento de assuntos femininos de Baghlan, e do mulá da mesquita da cidade de Baghlan. Na busca por uma nova esposa, talvez existisse um motivo para a família de Ghulam Sakhi procurar tão longe: eles queriam forçá-la a se prostituir, garantiram Zarifi, que acompanhou o caso de perto, e representantes do Ministério de Questões Femininas, em Cabul.

Em Baghlan, a menina foi imediatamente colocada pra trabalhar, cozinhando e fazendo faxina, mas conseguiu resistir à consumação do casamento durante semanas.

Ela fugiu para a casa de um vizinho, que avisou a polícia e a família do marido. Os vizinhos de Ghulam Sakhi e a polícia o forçaram a assinar uma carta prometendo não maltratar Sahar Gul, mas o deixaram levá-la embora.

O alerta teve pouco efeito. Um dia, quando reclamou de dor de cabeça, a sogra, Siyamoi, a enganou e, no lugar de analgésico, lhe deu um sedativo, disse Mushtari Daqiq, diretora executiva interina do grupo Mulheres pelas Mulheres Afegãs e também advogada de Sahar Gul.

'Ao acordar pela manhã, ela percebeu ter sido usada pelo marido', contou Daqiq.

Advogados da família afirmam que eles negam ter surrado ou drogado Sahar Gul e que as feridas foram provocadas pela menina. Eles negam que ela estivesse confinada no porão e sustentam que não tinham planos de fazê-la se prostituir. A acusação de prostituição não foi julgada.

Os advogados, pagos pelo grupo jurídico Da Qanoon Ghushtonky (Requerentes da Lei), que é financiado por ajuda internacional, argumentam que o clamor político fez com que o julgamento fosse apressado sem o devido processo.

Para eles, em vez de demonstrar a falta de proteção legal às mulheres, o caso de Sahar Gul ressalta a fraqueza do sistema jurídico ainda em desenvolvimento do Afeganistão, o qual pode ser manipulado facilmente por políticos como Karzai.

Siyamoi e Mahkhurd agora são duas entre as 171 presas de uma penitenciária feminina em Cabul. Recentemente, as duas mulheres insistiram na inocência e atacaram ferozmente os acusadores.

'Estamos sendo enganadas pelo tribunal', disse Siyamoi. 'Se me considera uma criminosa, por que não arranca minhas unhas?' Fonte: THE NEW YORK TIMES
Postagem Anterior Próxima Postagem